sexta-feira, 13 de abril de 2012
As riquezas segundo o Velho Testamento – parte II
Ética da riqueza
O ponto de partida da ética da riqueza é o fato de toda riqueza pertencer a Deus. E como Ele é o verdadeiro proprietário, Ele as dispõe como quer. Como lembrado por Ana: “O Senhor empobrece e enriquece; abaixa e também exalta” 1Sm 2.7. Este reconhecimento é o ponto inicial de uma atitude em relação à riqueza. Davi, na sua última oração, diz:
SENHOR, nosso Deus, toda esta abundância que preparamos para te edificar uma casa ao teu santo nome vem da tua mão e é toda tua. 1Cr 29.16
A fórmula aqui é surpreendente: o homem juntou o dinheiro, as madeiras preciosas, toda a fortuna necessária, e com tudo isso tendo sido feito, declara que fora Deus quem dera tudo aquilo. Assim, mesmo quando a riqueza surge unicamente como fruto do trabalho, Deus exige o mesmo reconhecimento de sua soberania.**
Os profetas nos chamam a atenção para o fato de que o julgamento recai sobre aquele que não reconhece esta realidade, como quando Ezequiel fala contra o príncipe de Tiro: “Porque tu disseste: Eu me enriqueci…”. Oséias nota o mesmo problema:
Ela, pois, não soube que eu é que lhe dei o trigo, e o vinho, e o óleo, e lhe multipliquei a prata e o ouro, que eles usaram para Baal. Os 2.8
Ou reconhecemos que o dinheiro e o ouro são de Deus, ou bem recusamos este reconhecimento. Neste caso, no entanto, a recusa não é em nada uma atitude objetiva de realismo como podemos pensar mais imediatamente.
E poderíamos aplicar todos preceitos morais sem que, contudo, a riqueza seja justa, pois quando aplicada a toda e qualquer circunstância, essa moral exprime a justiça somente como exteriorização do reconhecimento, pelo homem, de que a riqueza pertence a Deus. E se o homem não reconhece isso, essa mesma moral não exprime nada mais que a sua hipocrisia.
Em Provérbios 23.4-5, a Bíblia fala: “Não te fatigues para seres rico”. De um lado, não vale a pena dedicar-se penosamente ao trabalho tendo como objetivo tornar-se rico; por outro lado, mesmo reconhecendo sua fonte (Deus), não vale a pena endereçar-se a Deus para obter a riqueza. Certamente, é ele que a concede, mas como proclama Jesus: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas.” Tal é a situação da Antiga Aliança. Por duas vezes nos é lembrada a oração de Salomão, quando Deus responde-lhe: “Já que pediste esta coisa e não pediste longevidade, nem riquezas, [...] Também até o que me não pediste eu te dou, tanto riquezas como glória (1Rs 3.11,13)”. [1]
Não queira ficar rico!
A razão para isso é simples: a riqueza é uma futilidade.
Não te fatigues para seres rico; não apliques nisso a tua inteligência. Porventura, fitarás os olhos naquilo que não é nada? Pois, certamente, a riqueza fará para si asas, como a águia que voa pelos céus. Pv 23.4-5
E sabe-se também que a vontade de enriquecer conduz frequentemente, se não necessariamente, a desonestidade:
….o que se apressa a enriquecer não passará sem castigo. Pv 28.10
Esta perspectiva coloca, por conseguinte, não apenas o problema dos meios, mas do objetivo mesmo da atividade, do trabalho humano; e sem nenhuma exceção, esse trabalho não pode ser consagrado à obra vazia da riqueza.
A posse de grandes bens é, de qualquer modo, uma tentação. Não o mal por ele próprio, mas tentação. E não nos esqueçamos nunca do que pode ser a tentação quando ela é inscrita no contexto da queda. Pode-se dizer que houve uma tentação em estado puro, aquela de Adão. Mas, desde então, a tentação é acompanhada de uma potência extraordinária pela lei da queda. O homem, dado a sua natureza, não é íntegro face à tentação; ele provavelmente deve sucumbir a ela, pois faz parte do mal, e não possui força em si mesmo para resistir. Pelo fato de estar sujeito à lei da queda, o homem é hoje tal que cai todas as vezes, como que em virtude de uma lei da gravidade no nível espiritual. Por conseguinte, dizer que a riqueza é tentação significa dizer que ela não é neutra!
Desde o princípio, a riqueza é uma tentação porque o homem é levado a confiar mais em sua fortuna do que em Deus. Este é um tema bem conhecido que encontramos novamente no Novo Testamento. Aquele que dispõe de qualquer tipo de poder tem por tendência associar a este poder seu amor, sua esperança, sua segurança. Pois o homem prefere aquilo que vê e aquilo que possui àquilo que Deus promete e dá (cf. Sl 49.6-7).
O segundo aspecto da tentação é que a abundância material conduz o homem a desafiar Deus. Não somente a desconhecê-lo, mas a renegá-lo. Tal é o segundo aspecto da tentação:
não me dês nem a pobreza nem a riqueza; mantém-me do pão da minha porção de costume; Para que, porventura, estando farto não te negue, e venha a dizer: Quem é o SENHOR? Pv 30.8-9
Quando o homem é saciado, seu coração se enche de orgulho – é suficiente nos lembrarmos da longa queixa de Deus dirigida ao príncipe de Tiro e contada pro Ezequiel. [2]
**Na verdade, isso nos mostra que não existe situação em que a riqueza surge unicamente como fruto do nosso trabalho. “Não digas, pois, no teu coração: A minha força e o poder do meu braço me adquiriram estas riquezas. Antes, te lembrarás do SENHOR, teu Deus, porque é Ele o que te dá força para adquirires riquezas; para confirmar a sua aliança, que, sob juramento, prometeu a teus pais, como hoje se vê.” Dt 8.17-18
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